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Sobre o gênio Quentin Tarantino

Quentin Tarantino é para os cults-nerds-descolados o que Glauber Rocha é para os feios-chatos-intelectuais: um ser intocável, inquestionável e supostamente genial. Glauber devia viver rodeado de gente igualmente insuportável e nem devia lavar os cabelos. Tarantino deve falar sem parar, citar dezenas de bandas e livros que ninguém conhece e se achar um ícone.

Tentarei explicar melhor o meu ódio por essa divindade a partir do conceito de “espectador Homem Simpson” cunhado por Willian Bonner. Tarantino deve ter a mesma expectativa diante do seu público que Bonner tem diante do seu telespectador. No lugar de uma rosquinha devorada aos montes, estão alguns gibis e um mp3 player cheio de músicas que o Homer Simpson original nunca compreenderia. No lugar da TV, um computador portátil. O Homer Nerd é ávido por demonstrar sua cultura geral diante dos tolos de nível médio.


Cabe aqui apresentar outro conceito dessa vez criado por mim mesmo: o conceito de “metáforas justificadoras”. Diante de um filme “pop”, “pipoca”, “sem cérebro”, “sem sentido”, “sem explicação”, “sobre o nada”, os críticos cinematográficos adoram usar a tática das metáforas justificadoras para explicar o porquê de terem simpatizado com a produção. Funciona assim: tudo na verdade é uma grande metáfora de alguma coisa. Exemplo: Por se passar dentro de um Shopping, Madrugada dos Mortos usa a história de zumbis para fazer uma metáfora sobre o consumo desenfreado da sociedade capitalista. Pronto. Agora não vai ser feio você dizer numa mesa de bar ou no jornal que adorou Madrugada dos Mortos. Aliás, críticos de cinema adoram encontrar metáforas em tudo.

Tarantino é comumente apontado como sendo um cineasta que utiliza uma estética pop para apresentar uma metáfora sobre a nossa cultura, tradições e vida moderna. Não senhores, Tarantino não faz metáfora de porra nenhuma. Tarantino não é antropólogo. Suas histórias são banais, seus diálogos são vazios e seus filmes são sobre nada. O nada, o vazio e a banalidade não são metáforas sobre a superficialidade (ou qualquer outra coisa). Eles simplesmente são. O nada não necessariamente é uma metáfora sobre o nada. Ele pode simplesmente ser o nada.

Daí Tarantino nos coloca diante de uma cena super longa em que várias garotas conversam sobre nada em um carro (À Prova de Morte). Muitos apontarão 300 citações pops em um diálogo estúpido. Outros apontarão milhares de pequenas metáforas. Eu vejo o nada. Recortar um fiapo de diálogo sobre sexo não faz disso algo especial. Se eu filmasse a Raquel e o Fantine conversando sobre Gays Famosos, teria uma cena muito mais inteligente, pop e interessante. Como não sou o Tarantino ninguém veria citação pop nenhuma, metáfora nenhuma e inteligência nenhuma.

Toda pessoa para ser digna de ser uma pessoa deve necessariamente odiar sem motivos racionais e ter preconceitos sem fundamentação. Eu, por exemplo, odeio Recife, odeio estudantes de estilismo, odeio secundaristas, odeio acordar antes das 8 e odeio pessoas felizes em demasia. Tenho um preconceito inexplicável por pesquisadores/artistas que se vestem de forma estranha, por instalações artísticas, coletivos artísticos e jovens cineastas cearenses. No caso do Tarantino tenho um punhado de razões para odiá-lo. O problema é que tenho uma quantidade igualmente significativa de motivos para amá-lo. Será que sou um Homer Simpson Nerd enrustido??

Sobre aulas de didática

1. Ciências humanas é uma farsa.

2. Odeio didática.

Pronto. Essas foram as duas coisas que aprendi até agora no meu mestrado. Não agüento mais essa chatice de ter que compreender o pensamento ocidental. Prefiro o pensamento ocidental do Quake 4 e do Mario World ao pensamento ocidental de Nietzsche e Foucault. Só pessoas feias e chatas preferem Deleuze, Chartier, Baudelaire e afins. Eu prefiro o Perez Hilton. Ele sim representa o pensamento ocidental contemporâneo. Prefiro a JK Rowling que, como diz a Raquel Thomaz, assume que escreve ficção. Estou cansado. E não pensem que falo isso por me sentir superior a todos esses grandes pensadores. É justamente o contrário. Sou uma besta estúpida incapaz de ter um pensamento crítico sobre qualquer parágrafo escrito por um grande pensador. E não há nada que me faça ter mais ódio da academia do que a magnífica aula de didática.

Eu sempre digo que há os que gostam de comer fezes durante o sexo, há os que são masoquistas, há os que gostam de Teatro Mágico e há os que gostam de aulas de didática. Na minha sala há uma porção deles. De pessoas que gostam de aulas de didática e muito provavelmente que gostam de fezes e Teatro Mágico. Eu que devo ser masoquista de suportar durante quatro horas (que podem se transformar em 5 dias psicológicos) uma aula cheia de dinâmicas de grupo, discursos cheios de afeto e experiências inesquecíveis.

É duro ter que acordar 7 da manhã para começar o dia fazendo desenhos com canetinha colorida em um papel branco. É doloroso olhar para o rosto dos comedores de fezes e descobrir que todos eles estão maravilhados com essa experiência lúdica. Não amigos. Não fui feito para isso. O que mais me irrita é saber que depois de tantas discussões e afetos todos farão o que bem entenderem em sala de aula.

Eu me sinto um puto na aula de didática. Sinto-me um puto por ter que passar por isso por conta de uma bolsa miséria.

Hoje, senhores, eu sou um puto que sabe pintar em um papel branco e que muito em breve pode estar comendo merda.

Sobre Cidadão Instigado, Recife e Sweet Fanny Adams

O bom de ter um blog que ninguém lê é que nunca vou sofrer com comentários contrários ao que escrevo. Se tem uma coisa que odeio é quem não concorda comigo.

I – Juro que estava aqui tentando buscar argumentos para falar mal do Cidadão Instigado. Esse surto coletivo de elogios ao Fernando Catatau está me causando dias desconfortáveis.

É difícil suportar que o nosso sotaque tosco e insuportável seja jogado em nossa cara. É complicado ter que seguir uma cartilha ou manual de instruções para ouvir uma banda. “Para ouvir Cidadão você deve esquecer métrica, poesia clássica, modernidade, vocal afinado etc etc.” Ou seja: basicamente você deve esquecer que eles são uma banda. E não me venham dizer que o barato são as letras simples e sem frescura poética. Meu caro, você conhece algum grande escritor ou poeta famoso por sua simplicidade? Não, não existe. Nenhum artista é digno por ser comum.

O problema é que lá estou eu cheio de tomates na mão, cheio de vontade de gritar um “Ieiiiii”, cheio de vontade de dizer “mais uma banda cearense horrível”. Daí eles começam a tocar e sinto ódio por não ter argumentos para jogar um tomatinho sequer.

O barato do Cidadão é que eles são em parte o que nós somos. Enquanto quase todas as bandas desse lado do Brasil insistem em acreditar que estão fazendo música em Londres, Catatau faz música em Canoa Quebrada.

Não é fácil escutar “massa” em uma canção. Não é fácil ouvir nosso sotaque agudo e anasalado.

Não adianta. Mesmo o carinha que se veste de Inglês tosco, mesmo o carinha que nunca ouviu falar de Humberto Teixeira e Belchior, mas conhece a obra completa de Tom Waits e Johnny Cash, mesmo esse, irá soltar em algum momento do dia um “abestado” ou um “ei, macho!”. Ser cearense pode ser dolorido para alguns, mas é o que somos.


II – Não sei bem o porquê, mas odeio Recife. Passei carnavais inesquecíveis lá, mas ainda assim odeio Recife. Adoro repetir “Odeio Recife” pra todo mundo. É quase um bordão. A cidade é feia, suja, cheira mal, é menor que Fortaleza (embora todo recifense tenha a ilusão tola que não) e as pessoas não sabem explicar qual ônibus pegar. Apesar dessa minha transcendental rejeição, quase morei em Recife e já estive lá umas 10 vezes. Os mais ousados irão dizer: amor e ódio! Não, no meu caso é a insistência de Deus em me sacanear.

Aos recifenses desavisados que chegarem até aqui, não se importem com o que escrevo. Isso é apenas uma birrinha com um fundo de verdade. Todo mundo tem que ter uma cidade para amar e odiar. Escolhi Recife pela proximidade geográfica e também porque adoro competições tolas que não levam a lugar nenhum.

Posto isso, fui essa semana ver o show da famosíssima Sweet Fanny Adams. Digo famosíssima porque eles já foram selecionados para diversas coletâneas, embora nunca tenha ouvido falar de nenhuma deles. Eles foram inclusive selecionados pela Ultimate Billboard Top Mega Awards e venceram o Massachusetts Fabulous Choice. Com tantos prêmios e reconhecimento internacional não sei o porquê da banda continuar na pequena Recife.

Seria muito simplista acusá-los de apropriação do passado. Eu como um incipiente estudioso das relações passado-presente na arte não poderia cair nessa vala comum. Foda-se se cada música deles lembra alguma outra coisa que nós já tenhamos ouvido. Problema nosso.

Mesmo cantando em inglês a banda mantém suas raízes nordestinas. O que pode ser percebido nas camisas xadrez que eles usam, típicas das tradicionais festas juninas. Digna de nota é também a perfeita chapinha do vocalista. Obra de um cabeleireiro muito inspirado.

Pronto. O Sweet Fanny Adams se juntou ao Cordel do Fogo Encantado e Nação Zumbi dentro da categoria “Coisas de Recife que valem à pena”. E quando eles voltarem aqui, lá estarei eu pulando. Mesmo sem entender uma linha do que o vocalista canta em seu inglês britânico de Sobral. Mas quem se importa? Tem gente que não entende nada que o Catatau canta....

PS: Sim, eu sei que o Cordel não é uma banda de Recife.

Sobre o cinema matemático de Aronofsky

Minha confiança em cineastas não costuma durar muito tempo. Talvez isso seja fruto de minha pouca capacidade de criar laços afetivos com qualquer coisa. Minha entrega inicial logo se transforma em decepção sem volta.

Quase toda a cinematografia de Aronofsky parece fruto de cálculos matemáticos precisos. E embora a racionalidade esteja sempre em maior evidência, diante de suas obras ainda somos colocados dentro de um jogo de sensações nada exatas.

Pi talvez seja uma metáfora sobre a própria carreira do diretor. Um alucinado perfeccionista, detalhista e obsessivo em busca de uma fórmula que explique a vida. No caso de Aronofsky, a busca pelo cinema milimetricamente perfeito.

A fórmula de Darren Aronofsky é arriscada. Uma dose mínima que extrapole o estabelecido na tabela pode causar erros detestáveis: A Fonte da Vida. No entanto, quando todos os ingredientes são adicionados precisamente, temos o cinema matemático e perfeito de O Lutador.

Alguns podem odiar o filme, mas poucos conseguirão apontar o porquê. Os defeitos talvez estejam lá, mas pouco visíveis. Aronofsky consegue criar uma obra que não é perfeita, mas que não deixa seus erros e equívocos perceptíveis. Tudo está colocado em seu lugar: luz, câmera (as movimentações mais delicadas de sua filmografia), trilha sonora, atuações, edição. Não conseguiria apontar um só defeito.

A câmera, quase sempre na mão, só sai de sua discrição quando as lutas exigem uma agressividade um pouco maior nos planos. O que pouco acontece. E como é belo o "contra-luz" de Aronofsky. Como é bela a canção de Bruce Springsteen...

Sei que não é o seu melhor trabalho, mas não sei os motivos que o coloca inferior a Pi, por exemplo. Continuo confiando em Darren, embora o meu ímpeto de descrédito e desprezo sempre entre comigo na sala de cinema quando vou assistir qualquer obra sua. Maldito Aronofsky!