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Pelo fim do cinema

Artistas geralmente são arrogantes e assim devem ser. Não conheço um gênio que tenha um ego diminuto, não conheço grandes artistas que não tenham a noção do impacto que suas obra causam. Não me dou com artistas. No entanto, isso não me classifica necessariamente como uma pessoa humilde, apenas não tenho paciência com conversas sobre o estado contemporâneo da arte.

O cinema é uma arte arrogante. Com pouco mais de 100 anos de existência do cinematógrafo, o cinema tem uma atitude irritante de sempre ambicionar mudar nossa forma de ver e nos relacionarmos com as imagens.

Li um artigo dia desses no New York Times sobre o fim da narrativa. A teoria era a seguinte: nossos olhos e mentes estão hoje muito acostumados com histórias fragmentadas, desejamos uma certa interatividade (ou a ilusão dela) e queremos dar o nosso próprio rumo ao curso de uma ação. O vídeo-game e a Internet teriam supostamente colaborado com essa nova postura do olhar.

Cito aqui um exemplo clássico de uma tentativa de criar um cinema anti-linear e imprevisível: o soft cinema. Fruto da cabeça doente de Lev Manovich, um daqueles caras míopes do MIT, o soft cinema é constituído por um programa que gera seqüências em ordem aleatória a cada vez que é acionado. Ou seja, o software armazena uma série de seqüência de imagens que são colocadas em ordem aleatória, gerando assim, narrativas quase infinitas.

Mas não seria ambição demais, utopia demais, imaginar que o cinema poderia romper com uma tradição de séculos? Será que nós vamos ter que aposentar todos os nosso roteiristas em 10, 20 anos?

Posso estar enganado, mas creio que o cinema tem um espírito autodestrutivo. Nenhuma outra arte tem o desejo tão grande de se superar e destruir tudo que construiu até então. É como se para criar uma outra possibilidade criativa fosse necessário deixar para trás todo o passado.

Não me recordo de nenhum teórico, artista ou pessoa ligada à indústria teatral (se é que isso existe) que tenha tido a coragem de dizer que determinada forma de se fazer teatro desapareceria por conta do surgimento de uma nova proposta ou estética.

Porém, se o 3D surge (na verdade ele resurge), todo mundo sai espalhando por aí que em poucos anos as salas de cinema como conhecemos desaparecerão. Típica arrogância do cinema. Uma proposta nunca pode conviver harmoniosamente com outra. E a indústria já pagou caro por arrogância desse tipo. O próprio cinema 3D já passou de último grito da alta tecnologia para um grande fracasso comercial.

No cinema todo mundo se odeia. A facção da vanguarda, os videoartistas e os experimentais, odeiam a facção “cinema clássico”. É algo do tipo: “Escolha o seu lado!”. Quase uma guerra. Vanguarda depende do cinema clássico e o clássico necessita da vanguarda. Experimental nem sempre é genial, mas alguém tem que fazer.

Sendo assim, como já anunciei no início que não sou a mais humilde das criaturas, proponho algo mais arrogante e radical: o fim do cinema. Pronto. Duvido que algum artista doidão proponha algo mais revolucionário.

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